Rumo a um Complexo Construtivo na Projeção
por Gregory J. Markopoulos
RUMO A UM COMPLEXO CONSTRUTIVO NA PROJEÇÃO
Sinto-me impelido a escrever isto por várias razões: (a) por causa de uma recente viagem à Holanda e à Suíça; (b) por causa de várias discussões que tive em Bruxelas com os estudantes franceses e flamengos da INSAS, e também com os estudantes da Universidade Livre de Bruxelas; (c) por causa de contínuos problemas com a impressão do meu filme Gammelion [idem, Itália, Gregory J. Markopoulos, 1968]; (d) por causa da grave e persistente situação enfrentada pelo cineasta sério e criativo em todo o mundo. Pois a situação do cineasta não é hoje diferente daquela de vinte anos atrás; ou seja, o cineasta seriamente comprometido com sua obra — e não com alguma fantasia ideológica, política ou social, passageira ou duradoura, pouco importa — deve continuar a trabalhar muito só. Não se trata de viver em uma torre de marfim por escolha, mas sim com esforço e, como tenho dito frequentemente, com determinação sombria, evitando os males — aqueles males de que Shakespeare falou com tanta eloquência em Hamlet. Esses males, quando aplicados ao mundo do cinema, são múltiplos e continuam, diariamente, a confundir o cineasta sério — senão também a própria indústria cinematográfica comercial — como se torna evidente quando: (a) se considera o estado da projeção de filmes em cinemas, escolas e outros locais; (b) se considera o estado dos laboratórios; (c) se considera o estado da própria produção cinematográfica.
Parece que sempre neste rápido fim de século XX — e em séculos anteriores — os grandes potenciais foram relegados a uma espécie de falso esquecimento. Isso é verdade em todas as Artes-Ciências: pois Arte[1] e Ciência nunca estão separadas uma da outra. Uma é como o coração da outra, assim como uma é a mente da outra; sempre intercambiáveis e poderosas: intencionais quando utilizadas em sua função mais sublime: Buscar, Pesquisar. No entanto, as atitudes imperfeitas e confusas dos homens parecem sempre destinadas a progredir de forma curiosa. Lembro-me de um estudante de cinema que recentemente me perguntou: "Quais são os métodos experimentais que você utiliza?" Esse estudante não compreendia que um cineasta não busca deliberadamente o experimental; que um cineasta não procura métodos experimentais por serem métodos experimentais; que um cineasta não utiliza métodos experimentais que ouviu falar ou viu; e que, se um cineasta faz uma descoberta — (devendo-se postular que não importa se a descoberta é: (a) nova, ou (b) nova apenas para o próprio cineasta: ambas são iguais) — ela é rotulada como experimental geralmente por um crítico, um estudante de cinema ou pelos próprios espectadores. Todos os três, claro, acreditando que ao chamar algo de Experimental, percebem o próprio Sentido! Assim, as intenções conscientes do cineasta são confundidas por aquele que é talvez o pior mal de nossa civilização: tentar deliberadamente comunicar o que deveria, antes, ser aprendido lentamente — neste caso, o estilo e o sentimento, que são completamente diferentes de um cineasta para outro.
Tenho sugerido que as atitudes imperfeitas dos homens progridem primeiramente através do Comércio, inflado além das próprias necessidades da humanidade; inflado além das necessidades naturais do próprio Comércio; inflado sob o disfarce e aura de atitudes que permitem aquele vacilante e discutível avanço da Humanidade. O tempo, em si, é o atraso jocoso e diário; a águia que paira sobre o Progresso é a ferida da Falsidade.
Deixem-me mencionar o cineasta e, na mesma respiração, o homem do Comércio. Ambos desconfiam um do outro, das decisões um do outro: ambos sucumbem igualmente. E cada um é obrigado, senão motivado, a ignorar a atitude cautelosa do outro, a fim de Proteger e somar Progresso à atitude cautelosa do outro. O descrédito e a dor que seguem cada decisão são parte do serviço secreto acordado entre as partes e jamais admitido.
Com o cinema — o fotograma do filme, seu acompanhamento sonoro até agora, e o método de projeção — tudo isso foi, desde a invenção do celuloide, relegado pelos mercadores do meio a aquele tipo de falso esquecimento mencionado no primeiro parágrafo. Certamente, os mercadores que persistem no meio do cinema — para não mencionar outras artes — dividem-se em duas variedades: (a) o produtor, e (b) a variedade que ele atrai para sua teia; a variedade que lhe rende lucros sob a aura e maldição do presente cinema comercial ao redor do mundo. Que isso já tenha sitiado o New American Cinema, não há dúvida. E seu inevitável desaparecimento está, infelizmente, assegurado pelo avanço de tais *Intenções*. Para mim, é esse exato fato que me faz afirmar que o cineasta está hoje tão mal quanto sempre esteve!
Retornando ao fotograma, ao som e ao método de projeção: esses três, embora relegados ao falso esquecimento pelos mercadores do cinema, foram, no entanto, indiretamente salvos do esquecimento total. As desvantagens às quais esses três — fotograma, som, projeção — foram submetidos por razões de entretenimento duvidoso tornaram-se, desde então, a Necessidade que leva à ascensão aguda do filme como filme. Essa ascensão é conhecida por todos os cineastas, e é com seus degraus escorregadios que este ensaio se ocupa. Tornar-se consciente desses degraus, perseverar, ascender — é ser cineasta; e, de modo complementar, é ser o Novo Espectador de Cinema!
Hoje, quando os mercadores do cinema estão mais uma vez redesenhando, à imagem das atitudes sociopolíticas e socioestéticas (considero aqui a Pop Art), todos os clichês da distribuição — isto é, para atrair o público — torna-se imperativo para o cineasta sério, para o Novo Espectador de Cinema, reconsiderar as razões pelas quais aceitou o imperfeito no cinema: fotograma, som, projeção. Trata-se de reavaliar aquilo que se tomou como garantido. Gosto, tempo, conhecimento e atenção cumprem seu papel — e deveriam cumpri-lo ainda mais. Demandas devem ser feitas; mas que não sejam perguntas presunçosas dirigidas a cineastas que, ao apresentar sua obra, já falaram, já compartilharam suas mais profundas preocupações. Que as exigências começam, antes, pela qualidade da projeção: pois, no futuro, o projetista não será apenas um técnico ou operário comum, mas deverá ser quase como um maestro de sinfonia. Alguém que compreenda que, de um filme criativo para outro, há tantas diferenças quanto entre uma composição de Beethoven e uma de Stockhausen. Mas não para aí. Há a questão de como e onde o filme é apresentado; a temperatura da sala, o conforto do espaço, a intensidade da iluminação, o cuidado com que os arquitetos ignoraram — ou não — a construção de um espaço apropriado e propício à apresentação do filme, o cuidado com que os fabricantes de projetores produziram seus aparelhos sem serem infiéis ao público. O cineasta, o Novo Espectador de Cinema, deve olhar com decepção para o uso de lentes inadequadas na projeção, para o uso de lentes plásticas ou lentes zoom imperfeitas que desfocam a imagem, tornam-na plana.
Assim, o futuro do filme como filme reside tanto na projeção quanto em qualquer outro aspecto. A Nova Projeção de filmes com cópias duplas rodando lado a lado; filmes com uma cópia projetada para frente e outra para trás, simultaneamente; filmes em que a tela se divide em tríptico — mas diferente do Napoleão [Napoleon, França, 1927] de Abel Gance; filmes nos quais a imagem começa na tela central e, durante a projeção, outras partes entram em cena nas laterais; filmes em que as imagens são refletidas em vidro; ou mesmo, como sugeriu Robert Beavers, filmes em que um complexo de espelhos é mantido à frente da lente, reconstruindo a imagem sobre a superfície da tela — e além da tela.
Parece, finalmente, que tudo o que é filme como filme pode ser realizado por aqueles que são os Novos Espectadores de Cinema, por aqueles que devem estar dispostos à Nova Projeção, por aqueles que devem cuidar e preservar a imagem cinematográfica que contém a eternidade. E cada um desses deve, naturalmente, admitir que o interesse, que a liberdade, repousam em conhecer seus próprios limites — e em aceitar esses limites.
23 de maio de 1968
Petit Sablon, Bruxelas
Gregory J. Markopoulos
(Gregory J. Markopoulos. “Towards a Constructive Complex in Projection” In.: “Film as Film: The Writings of Gregory J. Markopoulos”. Londres: The Visible Press, 2014. Traduzido por Lain Hatsvne)
[1] NT: É importante esclarecer que certas palavras no texto publicado do Markopoulos estão propositadamente iniciadas com uma letra maiúscula. Foi escolha do tradutor preservar a escolha do autor.